NOTÍCIA

Entrevistas

Autor

Revista Escola Pública

Publicado em 29/09/2011

Pelo controle social

Pesquisador da UnB e membro da CGU, Marcus Vinicius de Azevedo Braga defende que conselhos do Fundeb tenham participação ativa nas escolas

 

Rayssa Ceo

Analista de finanças e controle na Controladoria Geral da União (CGU), Marcus Vinicius de Azevedo Braga é pesquisador na área de educação e acaba de se tornar mestre pela Universidade de Brasília (UnB), com dissertação sobre o controle social realizado pelos conselhos do Fundeb. Na entrevista a seguir, concedida à subeditora Marina Almeida, o analista com formação em pedagogia defende a necessidade de aumentar a participação da sociedade nesses órgãos e de uma formação de conselheiros que envolva também a dimensão política de seu trabalho. Para Braga, um Conselho que acompanhe o cotidiano da escola e tenha contato com os professores e a comunidade pode apurar as irregularidades no uso dos recursos, mesmo que não domine completamente os mecanismos burocráticos de gestão.

Qual a abordagem adotada em sua pesquisa sobre os conselhos do Fundeb?
Busquei prezar a contradição nos conselhos e, para isso, adotei a abordagem do materialismo histórico-dialético. Entrevistei os profissionais da área de controle que fiscalizavam o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e têm uma relação direta com esses conselhos, pessoas do Tribunal de Contas da União (TCU), da Controladoria Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Ceará, além de funcionários do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Escolhi o Estado do Ceará, porque, além de receberem a complementação da União pelo Fundeb e possuírem um Tribunal de Contas dos Municípios – o que garante mais especialização para tratar a questão -, seus municípios são mais homogêneos, facilitando o estudo. Também fiz um questionário para os conselhos sobre suas percepções, mas só três responderam.

Nem todos os estados têm um Tribunal de Contas dos Municípios?
Cada estado tem um Tribunal de Contas em nível estadual para fiscalizar os municípios, mas alguns têm um tribunal específico para eles. No Rio Grande do Norte, por exemplo, o mesmo tribunal que fiscaliza os municípios também fiscaliza a gestão estadual. Já no Ceará, há um tribunal só para a gestão estadual e outro só para a gestão dos municípios. A diferença se deve a questões históricas do desenvolvimento regional.

Como é a composição dos Conselhos do Fundeb atualmente? Há diferenças em relação ao Fundef?
Quando o Fundef foi criado, a preocupação com a repartição dos recursos levou à adoção de mecanismos de controle social, pois a estrutura dos Tribunais de Contas estava enfraquecida, com o país saído de uma ditadura militar. Mas o Fundef previa poucos mecanismos de proteção aos conselheiros. Quando chegou ao fim, os estudos baseados nas auditorias realizadas serviram de base para a criação de alguns mecanismos de limitação adotados nos conselhos do Fundeb, como o impedimento de que parentes do gestor municipal sejam conselheiros e de que o secretário de Educação seja presidente do Conselho. Mas ainda é preciso avançar, o Conselho do Fundeb deveria ter mais representantes da sociedade civil, os sindicatos, os movimentos sociais e o terceiro setor estão pouco representados.

Por que esses setores da sociedade participam pouco dos conselhos?
O Conselho do Fundeb não prevê essa participação, como ocorre em outros conselhos, como o da Alimentação Escolar. A presença de professores, diretores, alunos e pais não está, necessariamente, relacionada aos movimentos sociais. Além disso, como o papel dado a esse conselho é técnico, alguns movimentos sociais entendem que se trata de um trabalho mais burocrático, de assinar um parecer, e não veem ali um espaço de luta e defesa de direitos. Porém, mesmo sendo técnico, trata-se de um espaço predominantemente político na defesa de interesses. Esse Conselho deve ser ocupado e pressionado pela sociedade para se tornar um espaço de garantia da educação. Poucas vezes vemos um conselheiro ser consultado em matérias sobre educação na imprensa, por exemplo. Assim, o Conselho fica escondido e perde força, quando deveria ser consultado e pressionado para cumprir seu papel.

Qual o perfil desses conselheiros?
Não levantei esses dados em termos estatísticos, mas analisando as atas, principalmente nas cidades menores, vemos que são pessoas com pouca instrução com relação aos processos de compras e pagamentos. O representante do poder municipal acaba predominando, porque, além de ter conhecimento da máquina burocrática, possui mais disponibilidade e autonomia, o que gera um desequilíbrio na paridade.

Qual a solução para isso?
A capacitação é muito importante, mas não pode ser apenas técnica, sobre contabilidade pública e orçamento, deve ter um sentido de formação da consciência política e crítica. O conselheiro precisa entender sua atuação dentro do contexto da educação e ver os pareceres técnicos não como uma colaboração com o gestor na prestação de contas, mas como um instrumento para fiscalizá-lo e exigir dele que os recursos realmente se transformem em educação para quem precisa. Proponho que esses conselhos se articulem, troquem experiências e se fortaleçam. Não conheço um blog ou uma associação que reúna os conselheiros do Fundeb ou de outros conselhos desse tipo, mas a internet poderia ser um grande instrumento para eles. Os conhecimentos técnicos também são importantes e necessários até para fortalecer a dimensão política do trabalho, mas não deveriam prevalecer dessa forma. Ao dar um parecer sobre as contas, o conselheiro atua de forma mais técnica. Mas se, para elaborá-lo, ouvisse pessoas da comunidade, fosse à escola verificar alguns pontos daquela prestação de contas, fosse ver se a obra está ocorrendo e se os professores estão sendo pagos, fortaleceria também esse lado político.  Além disso, como esses documentos são muito técnicos, muitas vezes os conselheiros não conseguem perceber seus problemas, mas se há uma atuação concreta na rede, eles saberão, pois se há desvios e má gestão, isso se reflete no cotidiano.

Leia a íntegra da entrevista na edição 22 da revista Escola Pública, ou em www.revistaescolapublica.com.br.


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