NOTÍCIA

Carreira

Investimento no docente

Paranhos (MS) possui um dos melhores salários de professor do Brasil; valorização dos profissionais da educação conseguiu dar uma guinada na qualidade de ensino do município

Publicado em 31/01/2012

por Carmen Guerreiro

Ao colocar a melhoria da educação como uma de suas prioridades, Paranhos, na fronteira entre Mato Grosso do Sul e Paraguai, precisou começar de baixo. Com o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 3.2 nos anos iniciais do ensino fundamental em 2005, nenhum curso superior nas proximidades e poucas perspectivas profissionais para os docentes, a forma de correr atrás do prejuízo e investir na educação encontrada pela rede municipal foi a valorização do professor. “O profissional tem de estar motivado e capacitado, porque se investirmos nele teremos bons resultados, ele é a base de tudo”, afirma o prefeito Dirceu Bettoni.

Com apenas 13.355 habitantes, 14 escolas, 1.309 quilômetros quadrados e 30 ruas, Paranhos se tornou um ambiente exemplar que demonstra que, em alguns anos, com recursos bem gerenciados e aplicados, é possível reverter um quadro educacional e mudar a realidade local, ainda que isso seja algo que se construa aos poucos e os resultados apareçam a longo prazo.

Paranhos é hoje uma das redes municipais que melhor paga os docentes em todo o Brasil. O salário de um professor que trabalha 20 horas semanais é de R$ 1.330,26. São 212 professores na rede municipal, 80% com dedicação exclusiva à rede, lecionando para 3.670 alunos. Mas como Paranhos, com economia agropecuária, que se assemelha a outros pequenos municípios espalhados pelo país, consegue tal feito? “Esta vitória de nosso corpo docente se dá em primeiro lugar pela rigorosa gestão dos recursos recebidos, já que procuramos aplicá-los exclusivamente nos programas voltados à educação”, explica a secretária de Educação e Cultura, Ana Maria Falavigna.

A rede de Paranhos investe atualmente 28,3% de sua receita líquida em educação, o que representa 3,2% mais que o exigido pela Lei. Em relação aos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), os mesmos 60% exigidos para o pagamento dos profissionais do magistério em todo o país são separados para esse fim no município. A eficiente gestão dos recursos, que tem recebido destaque para além das fronteiras de Paranhos, é feita pelo Conselho de Acompanhamento e controle do Fundeb. Segundo a secretária, o rígido controle da verba por parte do conselho propicia uma influência maior não só no gerenciamento, mas também na aplicação dos recursos.

Mais do que salário, uma carreira
Para valorizar o professor, Paranhos não se preocupou apenas em oferecer um salário atrativo, mas também em tornar a carreira do magistério atraente. Por isso, o Plano de Cargos e Carreiras (PCC) do município foi desenvolvido com a participação efetiva de profissionais da educação em diversas esferas. “Houve uma vasta discussão em torno do nosso sistema de ensino e, após a filtragem das ideias, articulamos o processo do Plano, que começou na gestão anterior de governo”, conta a secretária Ana Maria. O Plano foi criado em 2008 para substituir o Estatuto do Magistério Público Municipal, que não era abrangente e não contemplava diversas questões, especialmente no que diz respeito à valorização do profissional por meio de salários atraentes, formação continuada e progressão de carreira. O PCC de Paranhos instituiu também um período durante a jornada de trabalho reservado aos estudos, planejamento e avaliação.

O Plano da pequena cidade de fronteira se diferencia por submeter o professor a avaliações periódicas que levam em conta: formação, titulação, dedicação integral ou parcial à rede municipal, produção científica e autoria de livros e publicações na área de educação, e o seu desempenho como profissional (medido por assiduidade, pontualidade, compromisso com as atividades da escola e produtividade). Dependendo da pontuação que o professor consegue de acordo com esses critérios, tem direito a uma progressão anual, que vai de 5% a 30% de aumento. Segundo a secretária, a diferença entre o salário de um professor no início, meio e fim de carreira (para 20 horas semanais) varia hoje de R$ 1.247 a R$ 1.529,79 e a R$1.729,33, respectivamente. As avaliações anuais são feitas por uma comissão constituída por um técnico da Secretaria de Educação e o diretor e um coordenador pedagógico da escola em que o profissional leciona.

Além disso, a rede investe também na formação dos educadores, que participam de dez capacitações ao ano, uma por mês letivo, voltadas para diversos temas, em especial novas tecnologias. Hoje, 98% dos professores municipais possuem curso superior, o que não era realidade poucos anos atrás. Mas uma parceria da rede com a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) trouxe o curso de Pedagogia à cidade. Por ser um município pequeno e de difícil acesso, as aulas eram ministradas apenas nos fins de semana, presencialmente, para os matriculados. Em seguida, a UFMS levou também o curso de Biologia. Outra parceria com a Universidade Anhanguera trouxe mais oito cursos, entre eles Administração, Ciências Contábeis, Letras e Assistência Social. “Antes importávamos professores, hoje podemos exportar. Estávamos muito distantes de lugares de formação de curso superior e conseguimos trazer isso para a nossa cidade”, comemora o prefeito Bettoni.

Segundo a Secretaria, não apenas todos os professores da área urbana de Paranhos hoje são graduados em sua área de atuação, como a maioria possui pós-graduação. Os 98% só não chegaram aos 100% porque, nas escolas indígenas, alguns docentes ainda estão cursando o Magistério indígena (Ará Verá) e outros o Curso Superior de Licenciatura Indígena (Teko-Arandu), que se divide em quatro modalidades. A primeira turma desse grupo concluiu sua licenciatura em 2010.

Paranhos tem a peculiaridade de receber muitos alunos indígenas brasileiros e paraguaios e busca se adaptar a essa realidade: os professores da educação indígena recebem formação especializada para a área na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), localizada no município de Dourados, que investe cerca de R$ 8.000,00 mensais no custeio dos professores indígenas de Paranhos. “Vale ressaltar que, das 14 unidades de ensino da nossa rede, nove são na área rural, pois contamos com cinco aldeias indígenas da etnia Guarani/Kaiowá e três assentamentos rurais”, explica a gestora indígena da rede, Cristiane Maria dos Santos Dembinski.

Outros destaques
Valorizar o professor foi o primeiro e principal passo para que Paranhos retomasse os trilhos de sua educação, mas a rede investiu também em ações paralelas para melhorar a qualidade do ensino. Todas as salas de aula (da área urbana) receberam lousas digitais com acesso à internet, e climatizadores – a cidade está em uma região extremamente quente, próxima ao Pantanal brasileiro -, e os prédios das 14 escolas foram reformados.

Outro grande investimento da rede foi no transporte escolar, que conta hoje com uma frota de 17 veículos que percorrem 2.462 quilômetros diários. “Temos ainda um professor que coordena todos os projetos educacionais e o processo de inclusão de alunos com deficiência no ensino regular, ações que foram premiadas pela Universidade Federal da Grande Dourados”, complementa a secretária Ana Maria.

A rede investe também na capacitação de merendeiras para a manipulação e conservação de alimentos, bem como na aprendizagem de novas receitas e informações sobre nutrição. Em 2009 conquistou o prêmio Gestor Eficiente da Merenda Escolar, promovido pela Organização Não Governamental Ação Fome Zero.

O Ideb de Paranhos hoje é 4.5 para as séries iniciais do ensino fundamental; o município ainda luta para melhorar o índice das séries finais, mas avança a passos largos em comparação aos primeiros resultados do índice em 2005, que foram de 3.2. Outro desafio é a retenção e o abandono. Em 2010, a taxa de reprovação foi de 20% e o abandono e a evasão chegaram a 4%. Segundo a secretária, esses índices envolvem, na maioria dos casos, alunos indígenas que costumam casar bastante jovens e abandonam os estudos para cuidar da família e trabalhar. Muitos também vão trabalhar em canaviais nas cidades vizinhas durante um período do ano. “Aos poucos as pessoas estão tomando o controle da educação em suas mãos, e hoje estamos preparados. Ainda estamos distantes da meta, mas nosso objetivo é preparar e formar uma base para continuarmos avançando”, afirma o prefeito Bettoni.

Autor

Carmen Guerreiro


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