NOTÍCIA
Publicado em 04/07/2012
Programas segmentados, mas interdisciplinares, dão o tom de crescente oferta pós-graduação na área educacional e criam oportunidades para os professores suprirem possíveis lacunas da graduação
O objetivo pode ser compreender a educação em sua relação com as diferentes áreas do conhecimento, suprir lacunas na formação dos professores, ou ainda abrigar objetos peculiares de pesquisa. Independentemente do motivo, a oferta e a procura por cursos de pós-graduação em educação têm crescido seguindo uma tendência: se alinhar com as necessidades dos docentes e das escolas.
Para se ter uma ideia, entre os cursos de pós-graduação stricto sensu na área de Ciências Humanas existentes no Brasil, a maior oferta está na área de Educação: são 182 cursos de mestrado, doutorado e mestrado profissional, de acordo com dados de maio da Capes. Mas a diferença na oferta não é apenas quantitativa, e sim qualitativa. Cursos cada vez mais voltados para áreas educacionais específicas começam a ser ofertados pelas instituições de ensino.
“Realmente estão começando a aparecer propostas de programas de pós-graduação que buscam oferecer contribuições específicas. Mas vejo uma tendência mais à interdisciplinaridade. Estão procurando compreender a educação em sua relação com as diferentes áreas do conhecimento”, explica Clarilza Prado de Sousa, coordenadora da área de Educação da Capes.
Temas do cotidiano
Para Cristina Deou, coordenadora do curso de educação especial e inclusiva da Universidade Federal Fluminense (UFF), os conteúdos nas pós-graduações estão cada vez mais segmentados e essa realidade visa tanto suprir lacunas nas formações dos professores, como também abrigar objetos peculiares de pesquisa.
Gravidez na adolescência, violência sexual infantil, discriminação de gênero, homofobia, uso de contraceptivos. Temas assim surgem de forma recorrente nas salas de aula, suscitando discussões e, principalmente, levantando dúvidas entre os alunos. Como analisar os fenômenos contemporâneos que se manifestam nesse território? Se o professor se interessa por esse campo específico, a partir de 2013 a Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus Araraquara, inicia o Mestrado em Educação Sexual, o primeiro do gênero no Brasil.
O programa foi recém-aprovado pela Capes e abrirá inscrições a partir do segundo semestre, com 20 vagas. Além de docentes, contemplará profissionais da área da saúde, que também se ressentem da falta de uma qualificação direcionada, na opinião dos coordenadores. Não sem motivo, o curso será oferecido na modalidade profissional. “Vamos inscrever quem já está no mercado ou quem pretende se inserir nele. A proposta é que os alunos tragam suas experiências para a faculdade e, ao final, elaborem uma dissertação relacionada às suas respectivas atuações profissionais”, explica Paulo Rennes Marçal Ribeiro, coordenador do programa, que também coordena o Núcleo de Estudos da Sexualidade (Nusex), criado há 12 anos, e que pode ser considerado o embrião do mestrado.
A iniciativa da Unesp em criar um curso “segmentado” não é isolada. Em todo o Brasil, há diversas faculdades que estão abandonando as linhas de pesquisa generalistas e optando por trabalhar um determinado aspecto da educação.
A crescente oferta de mestrados e especializações lato sensu na área de gestão confirma a tendência.
A atratividade da gestão
São programas que surgiram para atender à procura, surgida nas escolas, por profissionais capazes de implantar ferramentas de administração e controlar indicadores, fluxos de trabalho e processos operacionais. São necessidades que hoje estão disseminadas entre as escolas e acompanhadas de perto pelas instituições de ensino superior. “A definição das linhas de pesquisa busca atender à carência de formação na área”, concorda Clarilza, da Capes.
Em junho deste ano, a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), em Minas Gerais, vai titular os primeiros mestres em Gestão e Avaliação da Educação Pública. A primeira turma iniciou suas atividades em outubro de 2010 com 120 alunos inscritos. “O programa se apoia na experiência do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CAEd), da UFJF, que realiza atividades nas áreas de avaliação em larga escala, desenvolvimento de sistemas de gestão e formação de gestores da educação pública”, explica o professor Manuel Palacios, coordenador do mestrado. Ele acrescenta que o CAEd mantém programas de cooperação com inúmeros estados e municípios e que a demanda pela pós se originou nos locais onde o Centro atua.
Intercâmbio
Com cinco linhas de pesquisas, o mestrado combina atividades presenciais e a distância. “Em julho e janeiro, os estudantes se reúnem em Juiz de Fora. São ocasiões em que temos a oportunidade de oferecer cursos com professores convidados de universidades brasileiras e do exterior”, acrescenta. Em julho de 2012, serão recebidos docentes do México e dos Estados Unidos. O programa também mantém um intercâmbio com a Faculdade de Educação
de Harvard.
Ainda nessa direção, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSuldeminas) inaugura no segundo semestre a pós-graduação lato sensu em Gestão Escolar. Serão aproximadamente 200 alunos, sendo muitos deles professores da rede municipal. “A procura por docentes qualificados está impulsionando o surgimento de iniciativas para atendê-la. O curso exercerá um importante papel na profissionalização deste público”, acredita Valdirene Pereira Costa, coordenadora do programa, que está sendo viabilizado em parceria com a Associação dos Municípios da Microrregião Baixa Mogiana (Amog).
O currículo aborda questões relacionadas à gestão e também à elaboração de projetos político-pedagógicos e financiamento. Entre as disciplinas, destacam-se as de legislação escolar, planejamento, novas tecnologias educacionais, ludicidade, política, interdisciplinaridade e desenvolvimento.
Tecnologia
A Universidade do Estado da Bahia (Uneb) também tem um mestrado focado em gestão, mas seu programa tem um diferencial em relação aos demais: são duas áreas de concentração, sendo uma delas voltada à utilização de recursos tecnológicos na educação. “Na universidade, observávamos que havia um grande contingente de profissionais que procuravam a Uneb com uma carência por esse tipo de curso. Foi por essa razão que decidimos oferecê-lo”, esclarece o coordenador do Mestrado Profissional em Gestão e Tecnologias Aplicadas à Educação (Gestec), Ivan Novaes.
Dos 50 inscritos, metade está concentrada na linha “Gestão da Educação e Redes Sociais”, e a outra metade em “Processos Tecnológicos e Redes Sociais”. A primeira é orientada à formação de profissionais que atuam na Educação Básica e na educação superior, em especial os gestores, enquanto a segunda tem como objetivo capacitar docentes e outros especialistas a desenvolver tecnologias e artefatos que possam contribuir com a difusão do conhecimento, o que inclui desde a realização de planejamentos estratégicos até softwares.
Outro tema específico que vem recebendo atenção dos programas de pós-graduação é a educação especial. Em 2011, a Federal Fluminense iniciou especialização lato sensu em Educação Especial e Inclusiva. Todos os inscritos – 25 no total – são docentes de alunos com necessidades educacionais especiais.
Segundo a coordenadora, Cristina Delou, a pós tem a finalidade de suprir a formação com elementos curriculares que não são apresentados na graduação. “É uma especialização de 540 horas planejada como educação continuada, pois pressupõe o domínio de disciplinas importantes como história, psicologia, sociologia e fundamentos das políticas públicas de educação especial na perspectiva da educação inclusiva”, diz. O programa contempla cursos de libras, braille e sorobã (aparelho de cálculo), orientação e mobilidade, criatividade e superdotação, entre outros.
Embora essa especialização tenha sido criada em 2011, a faculdade de Educação da UFF há anos trabalha a questão, tendo inclusive desenvolvido na década de 1970 uma extensão em Educação Especial. Em 1990, o programa foi transformado em especialização, porém, em 2008 foi extinto. Nesse intervalo de tempo, a Faculdade continuou sendo procurada por interessados no curso e, percebendo a oportunidade, decidiu reabri-lo.
Com tantos assuntos a serem explorados, a Universidade Positivo, em Curitiba (PR), também teve a iniciativa de estimular a pesquisa na área e capacitar profissionais com o curso de especialização lato sensu em Educação Especial e Inclusiva. A primeira turma começou em 2011.
Educação inclusiva
“Os profissionais que buscam a pós são professores, pedagogos e especialistas. A procura é significativa”, assegura a coordenadora do programa ,Liliamar Hoça. O programa abrange questões de fundamentação teórica e metodológica relacionadas às deficiências visuais, auditivas, físicas e intelectuais, aos transtornos de comportamento, às altas habilidades e à superdotação. O currículo ainda prevê estudo sobre legislação, a inclusão e a inserção no mercado de trabalho. “Há uma necessidade por parte dos professores e demais profissionais de compreender o processo de ensino e aprendizagem dos portadores de alguma deficiência”, considera.
Opinião semelhante tem Enicéia Mendes, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação Especial (PPGEEs), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), que forma 120 mestres e doutores por ano. O programa de mestrado é oferecido desde 1978, e o doutorado, desde 1999.
Ela conta que na década de 70 havia resistência em relação ao conteúdo da pós. “Muitas pessoas achavam que um programa assim não era necessário, mas isso está completamente superado. Para dar conta da complexidade da área, foi preciso propor programas mais direcionados”, analisa. “Atualmente, o próprio governo exige temática especializada para contribuir com o desenvolvimento do setor”, atesta a professora, que em 2005 integrou a comissão de avaliação da Capes e já nessa época notava as transformações que hoje se materializam.
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