Experiências em todo o país mostram que é possível garantir que a política educacional não sofra interrupções a cada novo mandato
Publicado em 08/01/2013
Ainda não foi inventada a fórmula para se assegurar a continuidade das políticas educacionais a cada nova eleição, mas a experiência recente no país contém vários exemplos de situações que apontam as saídas. Planejamento, recursos suficientes, equipes técnicas qualificadas e controle social são alguns dos ingredientes dessas experiências.
A secretária de Educação de São Francisco de Paula, no interior do Rio Grande do Sul, Márcia Adriana de Carvalho, que está na gestão municipal há 16 anos, considera que a continuidade das questões ao longo das diferentes gestões é mais importante do que a permanência das equipes técnicas. “É preciso identificar as prioridades e implementar as ações para saná-las”, diz Márcia Adriana. “Os processos têm que ter continuidade, para que os resultados apareçam”.
Em São Francisco de Paula, que em 2005 estava na lista de municípios prioritários do Ministério da Educação (MEC) por causa do baixo Ideb, a ênfase das últimas gestões foi na formação continuada dos profissionais da educação. “Não apenas os professores e sim toda a equipe da escola”, explica a secretária. Segundo ela, os resultados já começam a aparecer: o município saiu da lista de prioridades e atingiu as metas de 2017 no Ideb.
O controle social é outro elemento-chave para a continuidade das políticas. No interior da Bahia, o Instituto Chapada de Educação e Pesquisa realiza, em 20 municípios, um trabalho centrado na mobilização da sociedade civil, com a finalidade de assegurar a continuidade das políticas educacionais nessas localidades após o resultado das eleições e a chegada dos novos gestores, acampanha Chapada e Semiárido pela Educação.
A ação envolve a elaboração coletiva de um documento com as propostas e prioridades eleitas pela comunidade tendo em vista a melhoria da qualidade da educação no município, a assinatura de um compromisso dos candidatos a prefeito para cumpri-las e o monitoramento do cumprimento das promessas ao longo dos quatro anos de administração. O monitoramento é feito por comissões de avaliação compostas pelos moradores de cada município.
Um dos picos da campanha é o Dia E, realizado em cada município antes das eleições municipais. Este é o momento em que as propostas são apresentadas e os candidatos que desejarem firmam o compromisso. Segundo a diretora executiva do Instituto Chapada, Cybele Amado, 20% das propostas classificadas como prioritárias são cumpridas. Considerando o conjunto das propostas, 70% são executadas.
“A estabilidade das equipes técnicas, somada ao compromisso e o acompanhamento social, são fundamentais”, analisa Cybele. O engajamento da sociedade, contudo, é construído ao longo do tempo, não ocorre de pronto. “É um processo formativo, que quando se consolida no município, tem efeitos muito positivos”.
A existência de projetos em parceria com a iniciativa privada é outro fator que colabora para a não interrupção dos projetos, afirma Sílvia Pereira de Carvalho, coordenadora executiva do Instituto Avisa Lá, de São Paulo. “Fica mais difícil desarticular uma ação que envolve vários parceiros”, analisa.
Tecnologia a favor das políticas
Duas iniciativas envolvendo a sociedade civil serão implantadas em 2013 como objetivo de colaborar para o monitoramento e a manutenção das políticas educacionais. Uma delas é uma plataforma digital que manterá o registro das ações e políticas em andamentos no município.
“O objetivo é garantir que o conhecimento acumulado durante uma gestão não se perca”, conta Priscila Cruz, diretora executiva do movimento Todos Pela Educação, uma das entidades envolvidas no projeto.
Ela lembra que, muitas vezes, a troca do titular da pasta da educação e de sua equipe gera uma desarticulação que impacta negativamente sobre as políticas. Outra iniciativa na mesma direção é o site “De Olho nos Planos”, que está sendo desenvolvido pela Ação Educativa em parceria com outras instituições. Como explica Denise Carreira, coordenadora de Educação da ONG, o objetivo é subsidiar e auxiliar os municípios na construção de seus planos municipais de educação, instrumento chave de planejamento, na opinião dela.
“Muitos municípios têm planos de educação produzidos por consultorias que fazem textos padrão para vários deles. Esse tipo de plano não funciona, porque é uma mera formalidade, sem nexo com o contexto local, sem o envolvimento da comunidade”, afirma Denise. Após a aprovação do Plano Nacional de Educação, em tramitação no Congresso, os municípios que já têm seus planos terão de revisá-los, e aqueles que não o possuem terão de elaborá-los.
A profissionalização da gestão
Equipes técnicas capacitadas e estáveis são essenciais para se assegurar acontinuidade das políticas no campo da educação. Atualmente, o cenário é mais promissor do que no passado, até por influências políticas nacionais de educação, norteadas por avaliações, metas e por estratégias que induzem ao planejamento nas demais esferas de governo, ou seja, nos estados e municípios.
“Apesar dos problemas, a profissionalização das equipes é cada vez mais comum”, afirma Silvia Pereira de Carvalho, coordenadora executiva do Instituto Avisa Lá, que há 26 anos trabalha com redes públicas de ensino. O PAR (Plano de Ações Articuladas), instrumento de planejamento vinculado ao Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), lançado em 2007 pelo Ministério da Educação (MEC) teve uma influência positiva para fortalecer a cultura de planejamento nas prefeituras, afirmam muitos estudiosos.
Como os municípios elaboram diagnósticos, definem metas e prioridades por meio do PAR, ele colabora para a continuidade das ações. “O PAR transcende os limites das administrações, por isso colabora para a permanência das linhas já definidas”, analisa Romualdo Portela, professor da Faculdade de Educaçãoda Universidade de São Paulo (USP).
Em conjunto com o PAR, a própria agenda das políticas nacionais, baseadas nas avaliações e indicadores, colabora para estabilizar os programas e ações. “Cria-se uma visão de consenso que não pode ser desconsiderada pelos gestores estaduais e municipais”, complementa Portela.
A qualificação dos profissionais, contudo, não deve se limitar às equipes técnicas: “Se o corpo docente é bem formado e faz um bom trabalho, fica mais difícil desarticular as políticas”, diz Sílvia Pereira de Carvalho, coordenadora executiva do Instituto Avisa Lá.