NOTÍCIA
O ofício alheio traz textos publicados entre 1964 e 1984 que aproximam temas como a química, a astronomia, a literatura e ciências naturais da experiência humana
Publicado em 08/05/2017
Logo no primeiro texto de O ofício alheio, Minha casa, o italiano Primo Levi discorre sobre a residência de sua família, onde apenas “com interrupções involuntárias” viveu toda sua vida, desde o nascimento, tendo ali também criado os filhos. Químico de formação, Levi tem uma das trajetórias mais marcantes na memória do século 20, o que tem a ver com algumas das interrupções involuntárias que menciona em sua crônica de abertura: de origem judaica, aderiu à resistência italiana na Segunda Guerra Mundial, foi capturado pelos alemães e levado ao campo de concentração de Auschwitz. Sobrevivente, foi capaz de exorcizar muitos de seus fantasmas com duas obras inescapáveis sobre a crueza humana a que ficou exposto seja em seu período como prisioneiro, seja após a libertação dos campos de concentração, quando vagou pela Europa sob russos e americanos, esperando engatar a estrada certa para voltar ao aconchego de sua casa em Turim. É isto um homem? (Rocco) e A trégua (Cia. das Letras) estão, certamente, entre os livros que resumem e ajudam a entender o século 20.
Já este O ofício alheio é a reunião de variada gama de escritos curtos de um Levi já seguro de que não poderia mais se desfazer da experiência da escrita como forma de reflexão. É, como diz Italo Calvino na apresentação, obra que a um só tempo reúne textos que “correspondem a sua vocação de enciclopedista das curiosidades vivazes e minuciosas e de moralista de uma moral que parte sempre das observações”. Observações que redundam em uma escrita perpassada pela destreza de sua formação primeira, que requer “a arte de separar, pesar e distinguir, (…) exercícios úteis também a quem se prepara para descrever fatos ou dar corpo à própria fantasia”, resume o próprio Levi. Os textos foram escritos entre os anos de 1964 e 1984.