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Ler e ouvir histórias do universo literário também desempenha um papel fundamental na formação de leitores. Para isso, no entanto, a escola deve ir além da simples leitura. Segundo Andréa Luize, é preciso investir numa ‘mediação potente’. “As escolas podem organizar sequências de leituras e situações de conversa. Dá para trabalhar, por exemplo, textos de acordo com os tipos de personagens”, explica. Esse trabalho que se aprofunda nos livros, autores e outros aspectos das obras, muito mais do que oferecer um caminho à alfabetização, permite que a criança desenvolva o hábito de leitura e aprecie a literatura por ela mesma.
Nos colégios particulares, o processo de formação de leitores literários costuma passar por visitas regulares à biblioteca, além do acesso aos chamados ‘cantinhos de leitura’, que contêm pequenos acervos de livros dentro da própria sala de aula. Para Mônica Mazzo, diretora pedagógica do AB Sabin, unidade infantil do colégio Albert Sabin, esses espaços dentro da classe são fundamentais para a aproximação das crianças com o universo literário. “Quanto mais livros em volta, quanto maior o contato com a literatura, maior o estímulo.”
Na Escola Santi, em São Paulo, o foco principal do trabalho com a literatura, segundo a coordenadora pedagógica Emiliam Santos, é justamente a formação do leitor literário. Nas visitas à biblioteca, as crianças não apenas leem e ouvem histórias, como também conversam sobre livros, autores e ilustradores. “Os alunos são convidados a posicionar-se como leitores, fazendo comentários, conversando sobre a forma de escrever dos autores”, explica.
Nesses projetos de mediação, um dos grandes desafios encontrados por escolas e professores é a escolha dos livros que serão trabalhados. Há muitas opções no mercado, mas é preciso dar atenção a aspectos que tornam a obra mais rica – e mais estimulante. Segundo Andréa Luize, a própria qualidade do texto é um dos fatores que separam obras literárias das não-literárias, e que deve ser foco de atenção dos educadores. “Tem também questões que dizem respeito à não-banalização da criança. Elas são exigentes, sabidas para enfrentar textos bem construídos. Outro ponto são ilustrações, que não podem ser muito estereotipadas.”
O sucesso desses projetos também passa pela formação do professor e do preparo para que esse profissional trabalhe os textos com as crianças. Para isso, os educadores devem ler e discutir os livros escolhidos para integrar o currículo. Segundo Eloisa Ponzio, também é preciso que a escola ofereça ao educador – e não só ao aluno – a possibilidade de estar mais próximo da literatura. “Na nossa escola, temos o gabinete de leitura, voltado aos adultos. Lá, há livros da área de pedagogia, mas também de literatura. A responsável pelo gabinete também faz apresentação e sugestão de títulos para os professores e outros profissionais da escola.”
Alfabetização
Se a alfabetização não precisa ser o foco do trabalho com a literatura, é bem verdade que é beneficiada por ele. Hoje, muitas escolas enxergam esse processo como algo natural, que começa a partir do momento em que a criança tem contato com a linguagem. “Deixamos a alfabetização acontecer de forma espontânea. Incitando o imaginário com a literatura, isso provoca perguntas, os alunos buscam respostas. Isso leva naturalmente para o processo de alfabetização”, diz Mônica Mazzo, do AB Sabin.
Para Andréa Luize, do Instituto Vera Cruz, a antecipação da meta de alfabetização para o 2º ano, instituída pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), pode preocupar pela possibilidade de as escolas passarem a priorizar aspectos instrumentais no trabalho com a literatura. “Isso pode acontecer sobretudo em escolas que fazem um trabalho mais tradicional, com cópia, ditado”, avalia. “É a alfabetização de um jeito ruim, em que se lê o texto literário para trabalhar as sílabas, por exemplo. Desconfigura o próprio texto.”
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