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Organização, respeito, autoconfiança e curiosidade. Cada vez mais o mundo contemporâneo exige que a escola ofereça aos alunos a oportunidade de desenvolver competências como essas ao longo da educação básica. As chamadas competências socioemocionais finalmente entraram no debate educacional – e no currículo – e […]
Publicado em 26/05/2023
Organização, respeito, autoconfiança e curiosidade. Cada vez mais o mundo contemporâneo exige que a escola ofereça aos alunos a oportunidade de desenvolver competências como essas ao longo da educação básica. As chamadas competências socioemocionais finalmente entraram no debate educacional – e no currículo – e trouxeram às instituições de ensino a necessidade de adaptação a essa nova realidade. O processo não é simples, mas é importante para a formação integral dos estudantes. E a preocupação estende-se aos docentes: tanto na formação, para que estejam aptos a trazer o tema para a sala de aula, quanto na possibilidade de aprimorar suas próprias habilidades.
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Além dos desafios do século 21 – como novas demandas do mercado de trabalho e avanços tecnológicos como a Inteligência Artificial (IA) –, marcos como a aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) reforçaram a importância de olhar para o desenvolvimento socioemocional dos estudantes e de promover uma formação mais completa.
“A partir da Base Nacional Comum Curricular, cada secretaria – sendo estadual ou municipal – teve de olhar, revisitar o seu currículo de modo a contemplar de forma intencional o trabalho com essas múltiplas dimensões, múltiplas competências dos estudantes”, explica Silvia Lima, gerente de projetos do Instituto Ayrton Senna, entidade que tem se tornado referência no assunto.
Ela ressalta, porém, que a Base fortalece o que outros marcos legais e documentos já indicavam, por exemplo, o relatório de Jacques Delors, da Unesco (1996), que fala das aprendizagens para o século 21.
De acordo com Silvia Lima, as competências socioemocionais nada mais são do que capacidades individuais que se manifestam por meio de pensamentos, sentimentos, comportamentos, atitudes e valores. “Essas competências favorecem que possamos viver e conviver melhor. Não só conosco, mas também com as outras pessoas”, conta.
É justamente por isso que são consideradas tão fundamentais: por permitirem que o aluno tenha uma formação mais completa. “Essas competências são úteis não só para a vida deles como estudantes, ou seja, para a aprendizagem, mas também para a relação com as pessoas fora da escola”, enfatiza.
Segundo Silvia, o ambiente escolar é adequado para esse processo por representar um espaço de confiança para que as competências sejam exercitadas e desenvolvidas, com um trabalho intencional e contando, ainda, com a mediação do professor. Trata-se de uma oportunidade para que o aluno, inclusive, avalie como está conseguindo ou não desenvolver essas competências e possa trabalhar a autopercepção.
No Instituto Ayrton Senna, conta Silvia, adota-se um modelo que agrupa as competências socioemocionais em cinco macrocompetências: autogestão, engajamento com os outros, amabilidade, resiliência emocional e abertura ao novo. “Pegando como exemplo a amabilidade, dentro dessa macrocompetência tem competências específicas que devem ser trabalhadas, como a empatia, o respeito e a confiança”, acrescenta.
O desenvolvimento dessas competências deve ser atrelado aos demais saberes que a escola deve trabalhar. Não se trata, portanto, da criação de uma disciplina de competências socioemocionais – mas sim de olhar para a intencionalidade de desenvolvê-las e de realizar esse processo de forma conjunta aos demais conteúdos em sala de aula.
Silvia Lima, do Instituto Ayrton Senna, exemplifica: se um professor de língua portuguesa vai trabalhar um gênero textual, como o cordel, por exemplo, ele pode observar de que forma usar esse conteúdo para desenvolver também o aspecto socioemocional dos alunos. Além de aprender sobre a estrutura do texto, a definição do que é um cordel e sua origem, o aluno também pode conhecer, escrever e produzir um cordel, desenvolvendo a curiosidade para aprender sobre outra cultura, ou mesmo ter a oportunidade de trabalhar com os colegas, em cooperação.
“O professor precisa, de forma intencional, olhar sua aula, qual conteúdo específico vai trabalhar – pode ser um problema de matemática ou um cordel – e, a partir daí, olhar também quais competências socioemocionais estará trabalhando atrelado a esse conteúdo”, explica.
Na Escola Teia Multicultural, instituição particular de educação básica de São Paulo, o socioemocional é abordado por meio de diferentes medidas, que vão da formação docente ao boletim socioemocional, que permite avaliar as habilidades dos alunos e, também, de forma mais ampla, de cada turma.
Produzido bimestralmente para estudantes da educação infantil ao ensino médio, o boletim traz aspectos e habilidades socioemocionais dos estudantes, organizados em um tripé: o eu (relacionado ao autocuidado, autopercepção e autoconhecimento, por exemplo), o outro (associado às relações sociais) e o ético (relacionado ao cumprimento de regras). Dentro desses temas, há diferentes tópicos. “É um retrato, um boletim da forma que ele [estudante] se comporta socialmente no ambiente escolar. E, também, como ele se percebe, como percebe a importância do outro, das relações com o outro, e como lida com as questões éticas”, resume Georgya Corrêa, diretora pedagógica e fundadora da Escola Teia Multicultural e da edtech Asas Educação.
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O documento também leva em conta as múltiplas inteligências e estilos de aprendizagem dos estudantes. “A gente aprende usando todas as nossas possibilidades, mas uma pessoa pode ser mais auditiva, mais sinestésica ou mais visual”, afirma a diretora. Desta forma, se há a identificação de que um aluno tem mais facilidade com o aspecto visual, pode ser sugerida a elaboração de cartazes para que ele possa aprender aquilo em que tem mais dificuldade, por exemplo.
Segundo Lucas Briquez, diretor administrativo da Teia Multicultural e CEO da edtech Asas Educação, o boletim também permite uma análise mais geral. “A partir dessa avaliação individual, a gente consegue fazer uma avaliação coletiva, no sentido de levantar, em cada turma, quais habilidades socioemocionais estão com necessidade maior de serem desenvolvidas”, afirma. Assim, é possível buscar atividades específicas de acordo com a necessidade do grupo.
Para que o desenvolvimento socioemocional dos alunos seja possível, porém, é fundamental olhar para o educador. Deve ter acesso a formações específicas e também à possibilidade de aprimorar suas próprias habilidades nesse sentido. “Tem muitas pesquisas, extremamente robustas, dizendo que o professor que desenvolveu as suas competências socioemocionais é muito mais capaz de ensinar para o aluno, de poder colaborar com esse processo e de que essa aprendizagem seja efetiva”, afirma Adriana Fóz, neuropsicóloga e diretora da NeuroConecte.
Georgya Corrêa, da Teia Multicultural, aponta que, além de pós-graduações, formações dentro do próprio ambiente escolar são opções de aprimoramento. Ela conta que, na instituição, há formações semestrais específicas. “São alguns dias que os professores têm tanto de trabalho de autoconhecimento, para se perceber, se conhecer, quanto formação em habilidades socioemocionais.”
O grande objetivo, no fim das contas, deve ser o de criar um ambiente que possa oferecer oportunidade de desenvolvimento para o aluno, sempre com uma vivência prática. Adriana Fóz lembra que as competências socioemocionais não podem ser aprendidas em um livro didático ou de forma desarticulada das situações da vida. “É algo que é ongoing, é vivido. É no momento em que a gente vai fazendo esses treinos”, afirma. A diretora Georgya Corrêa concorda: “É na vida vivida que se desenvolvem as habilidades socioemocionais”.
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