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A quinta competência da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) diz que os estudantes devem “compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir […]
Publicado em 31/07/2023
A quinta competência da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) diz que os estudantes devem “compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva”. Segundo um questionário virtual criado pela revista Educação com educadores em maio de 2023, cultura digital foi considerada a de maior dificuldade. A constatação também está presente em pesquisas de diferentes entidades.
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Para Lúcia Dellagnelo, doutora e mestre em educação e ex-diretora do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB), essa dificuldade é devida a dois fatores: falta de infraestrutura e de formação docente adequada. “Os professores não dispõem de infraestrutura necessária para trabalhar e não tiveram a oportunidade de aprender competência digital para ensinar aos alunos. As pesquisas no CIEB mostram que os educadores também dizem que as formações que as secretarias oferecem não são suficientes para usar a tecnologia na sua prática pedagógica”, conta.
A BNCC traz um conjunto de aprendizagens que todos os alunos devem desenvolver ao longo da educação básica. É um direcionamento para as escolas criarem o próprio currículo respeitando suas singularidades. “Uma parte do currículo (60%) é o que a BNCC coloca, os outros 40% devem ser feitos com componentes e, portanto, competências relacionadas ao contexto local. A questão é: quem sabe fazer isso nas mais de 140 mil escolas do Brasil? A formação continuada não vai dar conta de fazer isso de ontem para hoje. Vai demandar tempo. Só que praticamente já está vencendo o prazo de cinco anos da BNCC”, relata Ivan Siqueira, professor titular no Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos da Universidade Federal da Bahia (IHAC/UFBA) e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE) entre 2015-2022.
“Tem um artigo na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) que diz: quem faz o currículo é a escola. Por quê? Porque quem melhor que a escola para conhecer os seus estudantes? A questão é: todas as escolas sabem fazer currículo? Claro que não, está dada essa constatação. Então as redes estaduais e municipais, em geral, acabam realizando esse trabalho de construir o currículo, e por isso, muitas vezes não consideram as realidades [e os diferenciais] das escolas que compõem aquela própria rede”, complementa Ivan Siqueira.
É preciso ter qualidade na formação dos educadores para o desenvolvimento da competência digital e o curso online não é suficiente para desenvolver essas competências, alerta Lúcia Dellagnelo. “Os professores necessitam de aprendizagem entre pares, trocar ideias com outros educadores, e serem capazes de experimentar aquela tecnologia antes de propor na sala de aula. Há algumas condições da formação do professor que determinam se aquela aprendizagem vai ser efetiva ou não.”
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Na capital paulista, a estrutura e consciência sobre a importância do tema fazem com que o Colégio Visconde de Porto Seguro tenha uma diretora de educação digital, Joice Leite, responsável pela integração das tecnologias educacionais no currículo, que envolve o trabalho com a formação dos professores para o entendimento das tecnologias. Joice afirma que a cultura digital já está presente no Porto. “O colégio vivencia um período de ‘eficiência digital’, o trabalho contínuo pelo aperfeiçoamento do uso das tecnologias digitais para que o aluno desenvolva pensamento crítico e análise crítica sobre o seu uso.”
Dentre as dificuldades de colocar a quinta competência da BNCC em prática, Joice reforça que a formação constante dos professores segue sendo o maior desafio. Muitos docentes que chegam ao colégio não possuem o preparo ou o conhecimento necessário sobre o pensamento computacional.
“Temos o ciclo de formação docente pelas TDICs (Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação), em que todos os anos oferecemos um leque de formações aos professores realizadas por meio de sistemas de reciclagem para estarem atualizados e aptos [a utilizarem as ferramentas tecnológicas]”, explica Joice.
Atualmente, o colégio trabalha com inteligência artificial, fake news e comportamento na internet, que integram parte das práticas de cidadania digital. “Fizemos uma formação com nossos professores no começo do ano sobre ética e segurança dentro e fora da internet, e com toda a equipe do colégio. Fizeram uma revisão do nosso código de ética e de segurança. A preocupação é ter clareza da nossa responsabilidade enquanto educadores para instruir da melhor forma os alunos. Acho que esse é o dever dos educadores, educar para a vida e para a cidadania de uma maneira global e digital, porque esse é o momento em que estamos, não tem como fugir”, analisa.
O Colégio Visconde de Porto Seguro tem um histórico voltado à utilização das tecnologias nas práticas pedagógicas anterior à aprovação da BNCC, em dezembro de 2017. Dentre os projetos presentes na instituição, Joice Leite destaca a criação de um braço robótico construído pelos alunos do 7º ano, atividade interdisciplinar pensada na inclusão e que envolveu o conhecimento de robótica. Com o intuito de disseminar os projetos realizados pelos alunos, o colégio possui em seu site registro de todas as atividades. Clique aqui para conhecer os projetos de 2022.
Além da quinta competência da BNCC, ano passado o MEC aprovou a BNCC da Computação. Ivan Siqueira, relator do documento, diz que traz novos elementos e exemplos práticos para os educadores conseguirem aplicar os conhecimentos computacionais no currículo. O documento reuniu práticas funcionais de diversos países pensando na realidade do Brasil. “A gente viu tudo o que estava sendo feito no Brasil e fora dele e chegamos a um consenso de que aqueles elementos [presentes na BNCC da Computação] eram consistentes para pensarmos, não apenas na competência da BNCC, mas em tudo o que diz respeito à questão computacional, inclusive no tema inteligência artificial, que já está destacado [no documento].”
“É importante que todo cidadão tenha conhecimento sobre cultura digital, entenda as implicações da tecnologia em vários setores da sociedade, além de entender o que é hardware, uma placa-mãe de um computador ou até mesmo uma rede Wi-Fi. Fundamental saber essas questões que estão permeando nossa vida e que antigamente não eram ensinadas na escola por não serem consideradas necessárias. Hoje, a BNCC da Computação traz a cada ano o que os professores devem trabalhar em relação à tecnologia de forma mais detalhada para que possam entender o conteúdo e trabalhar com o tema”, acrescenta Lúcia Dellagnelo.