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A equipe escolar precisa ser acolhida, o que pede destaque no ambiente escolar para a saúde mental e emocional dos educadores. Cerca de 32,75% dos professores da educação básica sofrem com a síndrome de Burnout, aponta a pesquisa realizada pelo Instituto de Saúde e Sociedade […]
Publicado em 14/09/2023
A equipe escolar precisa ser acolhida, o que pede destaque no ambiente escolar para a saúde mental e emocional dos educadores. Cerca de 32,75% dos professores da educação básica sofrem com a síndrome de Burnout, aponta a pesquisa realizada pelo Instituto de Saúde e Sociedade (ISS/Unifesp), divulgada este ano, e que contou com a participação de 397 professores de diversos estados brasileiros de escolas públicas e privadas,.
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Marco Antonio Ferraz, educador há mais de 45 anos, falou da necessidade de a escola criar espaços de escuta e aprendizagem socioemocional voltada aos educadores no evento Socioemocional na Escola, promovido pela revista Educação hoje, 14, na Fecap, em São Paulo. Seu painel foi intitulado O novo papel social da escola e foi oferecido pela empresa SOMOS Educação.
Sócio-fundador da Prof. Assessoria em Educação, empresa que há mais de 25 anos assessora o desenvolvimento de escolas e gestores escolares, Marco trabalha há mais de 11 anos com projetos ligados ao desenvolvimento socioemocional nas escolas. Confira, a seguir, a entrevista que nos concedeu sobre o tema antes do evento acontecer.
Eu resolvi abordar a questão sociomocional para os educadores, gestores, professores e todo o grupo que trabalha na escola — aqueles que são normalmente chamados de administradores escolares, porque acho que se você pretende mudar o comportamento do aluno, a maneira mais correta é a modelagem. Hoje, nós educadores sofremos tanto quanto os alunos e outros profissionais de outras áreas todas as mazelas dos tempos atuais. Sofremos questões de ordem emocional, ideológica, política, financeira, mundial, de saúde pública.
É como no avião: quando as máscaras vão cair a primeira instrução é colocar primeiro em você e depois na criança. É mais ou menos esse o meu raciocínio. Hoje precisamos [nos cuidar] antes e mais até do que dos alunos.
Porque o título é O novo papel social da escola? Porque hoje a escola tem uma demanda diferente para os seus educadores do que simplesmente transmitir conhecimento. Temos necessidade de acolhimento, pertencimento, escuta e um papel social de formação de profissionais, um papel de ser quase um núcleo social para a comunidade na qual estamos inseridos. Então a rigor, você tem todo um redimensionamento da escola, e mais do que isso, ao mesmo tempo que somos agentes de todas essas transformações, somos pacientes de todas essas mazelas, demandas e necessidades que existem na sociedade.
Hoje existem muitos programas socioemocionais de qualidade e o que precisamos e sabemos é que os soft skills, ou o que a gente chama de habilidades e competências socioemocionais, se aprendem e se desenvolvem. Essa é a primeira grande vantagem. Não é um avatar que vem do céu e cai sobre mim, nem é um dom, é uma coisa que eu aprendo como aprendo línguas. Claro que com as línguas existem coisas que são mais fáceis para alguns e mais difíceis para outros, mas dá para aprender e desenvolver e se é possível, vamos estudar. Então a primeira coisa é que o gestor deve proporcionar aos seus funcionários, aos seus educadores e para ele também, estudar socioemocional, o programa que adota e outros programas.
Segundo, fazer encontros com os pais para discutir o desenvolvimento de habilidades e competências socioemocionais. Empatia, por exemplo, já resolveria muito problema do mundo se a gente tivesse uma visão empática, uma escuta empática do outro. Uma visão de respeito à diversidade, à capacidade de trabalho em grupo que não é divisão laboral, é capacidade sinérgica e de colaboração, ou seja, as habilidades socioemocionais, hoje, fazem do profissional alguém que se destaca. Então vamos desenvolver isso na nossa comunidade. Vamos chamar quem conhece para fazer um trabalho sobre isso.
A escola não é clínica, igreja ou seita. Quando digo de um novo papel social da escola, digo da função de acolher, de dar pertencimento, de ouvir, de orientar, mas nós não somos psicólogos.
Precisamos também sair da zona de conforto. A sociedade hoje nos pede isso. Oportunidades e caminhos existem. A escola precisa promover [o trabalho com desenvolvimento socioemocional] para os seus educadores e para os pais. Para os seus alunos já promove porque a BNCC obriga. Agora precisa promover para os professores e para os pais, e não é só promover e ir para casa, é sentar lá junto e escutar também, porque tem muita coisa para a gente aprender.
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A primeira, e mais importante delas, é ter a consciência da necessidade de termos o socioemocional para as nossas vidas e para a gestão escolar. Eu acho que essa é a minha principal meta: conseguir que os gestores percebam a necessidade de ter uma administração e gestão escolar mais humanizada e voltada para as questões socioemocionais. Por que eu digo isso? Se você pretende gerir pessoas, a primeira consciência que precisa ter é que as pessoas te percebem, a princípio, pela emoção e não pela razão. Isso é uma característica do ser humano selecionada durante milhões de anos por uma questão de necessidade de sobrevivência.
Eu não podia usar razão na hora que eu visse um leão. Parar e dizer ‘olha, eu acho que pelo perfil isso é um leão e eu acho que ele está com fome e vai me atacar’. Não. ‘Eu bati o olho, vi uma imagem de leão, ou eu ataco ou corro’. A emoção é o meu primeiro estímulo e isso não foi apagado.
A escola não é uma loja, não é uma fábrica, escola são pessoas. Alunos, professores, pais e gestores são pessoas. Se não estivermos preparados para trabalhar as suas emoções, se não estivermos trabalhando para perceber que isto é uma realidade, vamos ter problemas de gestão. A demanda social maior da escola hoje é ser um núcleo de humanização, essa é minha segunda reflexão. Se você parar para pensar não existe outra instituição na nossa sociedade com essa capacidade. A igreja, o clube e a rua não são mais, o condomínio também deixou de ser.
Você não chega na escola e escuta o seguinte: ‘se o senhor quer falar com o coordenador aperte um, se quer falar com o diretor aperte dois, se quiser pagar aperte três, se ficar com dúvida aperta quatro e volte ao menu principal’. Não é assim. É uma instituição que você chega e só tem pessoas para te atender, para você conversar e falar. Essa característica de que a escola passa a ser um núcleo humanizador na sociedade dá uma outra dimensão a ela e um outro compromisso.