NOTÍCIA
Fenômeno foi previsto por Einstein um século atrás
Publicado em 09/05/2016
Desde a Teoria Geral da Relatividade, proposta em 1916, cientistas acreditam que as ondas gravitacionais se originam por meio de explosões estelares e fusões de buracos negros, com mais energia do que bilhões de bombas atômicas. Todavia, a dificuldade de comprovar o fenômeno deve-se ao fato de ele não ser muito frequente e, principalmente, ocorrer a milhões de anos-luz da Terra, fazendo com que as ondas sejam tão fracas quando se aproximam de nosso planeta a ponto de não poderem ser detectadas.
Ondas gravitacionais abrem a possibilidade de escutar onde até então nada era visto, como os misteriosos buracos negros |
Agora, com a anunciada descoberta, os pesquisadores se entusiasmam em propagar uma nova era para a ciência em sua ininterrupta missão de compreender o Universo. Se até hoje toda a informação que temos do Cosmos é proveniente da luz (visível, infravermelha, raios X) e ondas eletromagnéticas, as ondas gravitacionais abrem a possibilidade de escutar onde até então nada era visto, como os misteriosos buracos negros. Os cientistas acreditam que a nova descoberta permitirá reconstruir o que aconteceu no ponto de origem e quais as propriedades desses corpos.
Hawking, em entrevista à BBC, disse que a comprovação da teoria de Einstein abre as portas para uma nova forma de se olhar o universo e que “a capacidade de detectá-las [as ondas gravitacionais] tem o potencial de revolucionar a astronomia”. Para Hawking, a detecção dos sinais deixados por grandes cataclismos no Universo é “a primeira prova de um sistema binário de buracos negros e a primeira observação de buracos negros em fusão”. “Além de provar a Teoria Geral da Relatividade, podemos esperar ver buracos negros ao longo da história do Universo. Poderemos até mesmo enxergar os vestígios do Universo primordial, durante o Big Bang”, declarou o físico britânico.
Em entrevista à BBC, Alicia Sintes, do departamento de física do Instituto de Estudos Espaciais da Catalunha, na Espanha, também ela participante do projeto, disse que, com a descoberta, o que se tem agora são sentidos diferentes e complementares para estudar as mesmas fontes e com isso extrair muito mais informações. “Não estamos falando de expandir um pouco mais o espectro eletromagnético, mas de um espectro totalmente novo.” A partir de agora, ela explicou, os físicos poderão olhar os objetos com as ondas eletromagnéticas e escutá-los com as gravitacionais. Alicia afirmou que as ondas eletromagnéticas dão informações sobre o Universo quando ele tinha 300 mil anos de idade, enquanto que com as ondas gravitacionais “podem-se ver as ondas que foram emitidas quando o Universo tinha apenas um segundo de idade”.
Fundado em 1992, o Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser (LIGO) reúne mais de mil cientistas de cerca de 40 instituições em 16 países, entre eles físicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do IFT-Unesp (Instituto de Física Teórica da Universidade
Estadual Paulista). Com investimentos de US$ 1,1 bilhão da National Science Foundation, as primeiras medições à procura das ondas gravitacionais começaram em 2001 e duraram nove anos, sem sucesso.
Instalação do Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser (LIGO) na Hanford Reservation, no Estado de Washington |
Em 2010, com novo aporte de recursos em busca de melhorias, o LIGO desenvolveu os espelhos mais perfeitos do mundo, lasers potentes e sistemas de isolamento de vibração do solo. Cinco anos depois, em 2015, o observatório voltou à ativa. Hoje são duas instalações em forma de “L”: uma no Estado de Louisiana e outra no Estado de Washington, separadas por 3 mil quilômetros de distância.
Em cada local há um feixe de laser, com quatro quilômetros de comprimento, que é gerado e dividido em dois. Espelhos posicionados ao final dos dois túneis rebatem os feixes para um lado e para o outro muitas vezes, antes que se recombinem. Se uma onda gravitacional passa pelo túnel, ela distorce levemente seu entorno, mudando a longitude dos túneis numa fração da largura de um átomo. Dependendo de como as ondas se movimentam, isso indica que um túnel se comprime e outro se estica, fazendo um raio laser viajar uma distância levemente maior, enquanto o outro faz uma viagem mais curta.
Segundo os pesquisadores do LIGO, atualmente é possível detectar alterações nos braços de laser equivalentes a um décimo de milésimo do diâmetro de um núcleo atômico, a medição mais precisa já obtida por uma ferramenta científica. Os cientistas explicaram durante o anúncio da descoberta que são necessários pelo menos dois detectores para evitar falsos positivos causados por qualquer outra vibração, como terremotos, tráfego ou flutuações do próprio laser. Assim, se houver mesmo a influência de uma onda gravitacional, a perturbação será exatamente igual tanto na Louisiana quanto em Washington.
Apesar de descoberta cem anos depois de ser prevista por Albert Einstein, a partir de agora, quando as ondas gravitacionais foram enfim comprovadas, os cientistas acreditam que as investigações estão apenas começando. Os pesquisadores afirmam que o LIGO hoje pode enxergar a uma distância de aproximadamente um bilhão de anos-luz da Terra, mas sua equipe já prepara novas melhorias tecnológicas para aumentar sua sensibilidade.
Tendo como parâmetro outros momentos de grandes descobertas da ciência, pode-se prever que as maiores revelações ainda estão por vir, talvez de áreas cujas dúvidas sequer foram ainda levantadas. Mesmo considerando somente a Teoria Geral da Gravidade, que descreve muito bem o Universo em grandes escalas, em escalas menores ainda há muito para compreender. Por isso os cientistas acreditam que investigar lugares com gravidade extrema, como os buracos negros, trará incríveis revelações sobre a origem e a constituição do Universo.
No ano seguinte ao aniversário de um século da Teoria Geral da Relatividade de Albert Einstein, as mentes e os esforços dos mais de mil cientistas atuantes no projeto do LIGO dão indícios de que o avanço da ciência segue firme no objetivo, talvez sem fim, de tentar explicar aquela antiga questão filosófica: de onde viemos e para onde vamos?