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Edição 242

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Publicado em 13/09/2017

Redes estaduais de ensino médio introduzem currículo, monitoramento e sistemas de avaliação, mas formação docente fica em segundo plano, aponta pesquisa

Estudo do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ações Comunitárias) analisou propostas instituídas em quatro estados brasileiros – Goiás, Pernambuco, Ceará e São Paulo

A busca por respostas que possam mudar a realidade do ensino médio brasileiro, há tempos visto como a etapa com desempenho mais crítico da educação básica do país, intensificou-se nas últimas duas décadas, sobretudo na última. Se os resultados ainda não são suficientes para retirar o país daquelas incômodas posições nas avaliações internacionais, já são suficientes para jogar alguma luz sobre os rumos que estão e que não estão sendo tomados.
E, a julgar pelo estudo “Políticas para o ensino médio e desigualdades escolares e sociais”, organizada pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ações Comunitárias (Cenpec), feito a partir da análise de propostas instituídas em quatro estados brasileiros – Goiás, Pernambuco, Ceará e São Paulo, todos eles com forte aposta em escolas de tempo integral – há aspectos que parecem bastante claros.
Entre eles, um dos que parecem mais óbvios é que a melhoria dos níveis de aprendizagem dos alunos não pode prescindir de monitoramento frequente e de ações coordenadas no plano dos sistemas. A partir daí, os sistemas conseguem gerar informações para estabelecer ou corrigir suas rotas e dar unidade à atuação das escolas.
Nos quatro estados, aliás, foram identificados quatro elementos comuns e articulados entre si em suas políticas para o ensino médio, instituídas dos anos 90 em diante. São eles: a introdução de currículos associados a metas de aprendizagem pormenorizadas; o monitoramento dessas metas; sua articulação com sistemas de avaliação, incentivados por políticas de responsabilização, entre elas a bonificação docente e, nota preocupante, baixo investimento em ações de recrutamento e formação docente.
Postas em conjunto, essas variáveis apontam para uma aposta alta na amarração entre currículos bem discriminados, articulados a materiais didáticos – em alguns casos, como nas redes paulista e pernambucana, especificados aula a aula –, acompanhamento via avaliações e ações mais voltadas à ideia de treinamento docente do que à formação propriamente dita.
Para Antônio Augusto Batista, coordenador da pesquisa, o lado positivo da trama é o fato de esses processos terem sido organizados, carência que afetava as redes. “Ter um currículo, ainda que com problemas, elucida o que se quer e possibilita o acompanhamento. As avaliações fornecem elementos para reorientar as ações.”
Porém, alerta Batista, tudo isso pode ser mais bem explorado, caso as informações geradas sejam utilizadas não só para modificar os currículos e as próprias definições das grandes finalidades e objetivos das redes, sua articulação com a continuidade dos estudos dos alunos ou com uma educação básica mais efetiva, como para garantir uma autonomia mais qualificada às escolas.
“Essas políticas funcionam muito bem como algo de curto prazo, mas é preciso pensar uma política complementar de médio e longo prazo, levando em conta a formação dos professores, a autonomia da escola e a melhoria dos processos. O que foi instituído até agora resolve o problema dos gestores, mas não o educacional”, resume.
Ou seja, escolas e redes que funcionavam sem processos e objetivos claros ganharam uma engrenagem em que as peças foram movidas para que tudo rode na mesma direção, porém, o próximo passo é estabelecer os meios para que as partes dessa engrenagem possam funcionar de forma mais autônoma. O que passa obrigatoriamente pela formação docente.
Cotejo de modelos
Entre os quatro estados, Pernambuco é aquele que tem os processos e engrenagens mais interdependentes. Dessa forma, simboliza melhor o modelo de gestão por resultados, com monitoramento constante.
Em vários níveis, principalmente no currículo, a formulação da política contou com participação de várias instâncias, seja de professores ou de instituições como universidades locais e Undime. Desde 2008, o estado conta com uma Base Comum Curricular e Orientações Teórico-Metodológicas. Tudo está articulado entre o currículo e a avaliação (Saepe), inclusive as formações continuadas, concentradas nas áreas de língua portuguesa e matemática, objetos das avaliações. Os aspectos mais ressaltados no estado são a oferta de educação integral, que cresceu muito desde a virada da década, e a gestão por resultados.
No caso do Ceará, estado em que o regime de colaboração entre os diversos entes federados representa o caso de maior sucesso no Brasil, o currículo foi substituído por um conjunto de objetivos baseado “no Enem e nas matrizes do próprio sistema de avaliação”, ressalta o estudo. O fator distintivo aqui é a alta capacidade de gerar mobilização social para os objetivos preestabelecidos.
A pesquisa aponta que há mais “políticas docentes” que ações de formação no Ceará. A formação dos professores é inadequada em 1/3 das escolas pesquisadas. As escolas profissionais se beneficiam da dedicação integral, mas no conjunto da rede há apenas “formações tópicas desenvolvidas no âmbito das próprias escolas”. A formação fica circunscrita mais às atividades de planejamento, insuficientes.
Assim como em Pernambuco, em Goiás e São Paulo, é o currículo que dita as ações de formação e a abordagem metodológica, discriminadas por meio de cadernos aos professores.
A introdução dos currículos, ressalta Batista, do Cenpec, tem efeito positivo, ajudando inclusive a dar sentido de rede às escolas. Segundo ele, porém, um aspecto que a pesquisa encontrou – e que pode ser objeto de outro estudo – é o fato de que muitos educadores não se percebem como parte de uma rede. “Têm percepção das escolas vizinhas, por competição e outros fatores, mas não da rede. Para eles, as pessoas de fora, que dão ordens e fazem mudanças e reformas, são gente que inventa coisas para atrapalhar”, diz.
Para o coordenador da pesquisa, a ideia de que a escola faz seu currículo e não se comunica com a rede é nefasta, pois é preciso que haja organização e coordenação. Mas, para que as políticas propiciem um segundo estágio de melhora, é preciso que esse processo se volte à formação e à autonomia docente. Até agora, há um grande controle da parte metodológica.
“Muitos supõem que o professor não domina esse quesito, o que em muitos casos é verdade. Mas se com o tempo não se investir no professor, a política se torna inócua, não haverá mais avanço”, avalia Batista.
Pode-se supor que ele esteja certo. Do mesmo jeito que professores que não gostam de ler dificilmente estimularão seus alunos a se tornarem leitores, é pouco provável que docentes que sejam apenas cumpridores de determinações prescritas por terceiros possam desafiar seus estudantes a irem além dos manuais, a fazer com que tenham um aprendizado efetivamente reflexivo. Organizar processos e ações não quer dizer controlar todo o processo educativo.

Fonte: Inep/MEC

Fonte: Inep/MEC


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